Embarcações Vikings

        
        Nós já vimos em artigos anteriores que os vikings eram exímios comerciantes, estabelecendo rotas comerciais que se estendiam desde a ponta da península escandinava até o Oriente Médio, passando por Constantinopla. Além disso, não podemos nos esquecer da memória que foi construída acerca desse período e desses povos, como saqueadores marinhos capazes de surgir no meio da névoa do mar e de desaparecer na mesma em questão de instantes. Em artigos mais recentes vimos também como o mar era fundamental na dieta dessas populações que viviam em solo montanhoso e pouco arável.
        Todos esses elementos citados são aspectos muito característicos do período e estão todos conectados ao que talvez seja o mais característico e mais memorável aspecto da Era Viking: a navegação. Se podemos dizer que a figura mais difundida do período é o incorreto elmo de chifres, em segundo lugar com certeza é o drakkar, o famoso barco de guerra dos vikings. Os escandinavos do período desenvolveram um tipo de embarcação que só veio a ser superada cerca de seiscentos anos mais tarde pelos portugueses, com a invenção das caravelas e naus. E é sobre as embarcações vikings que falaremos um pouco neste artigo.

Como eram as embarcações vikings?
   
Fotografia do knorr Skuldelev 1. Encontra-se no Museu
de Barcos Vikings de Roskilde, na Dinamarca.
Os escandinavos possuíam diferentes modelos de barcos para diferentes funções navais. Ao pescar e comerciar, acredita-se que o modelo favorito seria aquele que conhecemos como knorr. Mais curto e com maior capacidade de carga, oferecia quase nenhum poderio militar, mas podia facilmente navegar pelos rios que eram usados como rota comercial ou ir até onde os peixes estavam. Por ser uma embarcação propícia ao comércio e às longas viagens, foi com o knorr que os escandinavos chegaram às ilhas Orkney e Shetland, à Islândia, à Groenlândia e à América do Norte. Graças à sua capacidade de levar bastante carga, prestou-se ao transporte de colonos, como foi o caso da povoação da Islândia.
        É, por vezes, erroneamente confundindo com o drakkar, a típica embarcação longa destinada à guerra e à conquista, que diferia do knorr essencialmente pela presença da grande carranca na proa. O knorr podia ter carranca, mas seu uso não era tão comum e seu tamanho era bem menor se comparada a do drakkar. knorr tinha uma média de 12 metros de comprimento por 3 metros de largura no centro, onde o casco atinge o máximo da curvatura, e podia levar uma carga de 5 toneladas. Porém, existem evidências de exemplares maiores, como é o caso do Skuldelev 1, um dos cinco exemplares de knorr encontrados em Skuldelev, na Dinamarca, que mede 16 metros de comprimento por 5 metros de largura no centro e podia levar uma carga de aproximadamente 10 toneladas. Sua construção era feita com carvalho e outras árvores típicas da Escandinávia, sendo bem mais em conta se comparada a uma embarcação de guerra.
        No que se refere a saques e incursões militares, o modelo de embarcação adotado seria aquele que hoje conhecemos como drakkar, que eram propícios para tais práticas. O drakkar é o clássico "navio com cabeça de dragão" usado para transportar os saqueadores às terras distantes, impulsionados tanto por vela quanto por remos. Mais estreitos, porém muito compridos, eram projetados para carregar um número grande de homens em excursões com diferentes tipos de terrenos, garantindo também que o saque fosse extraído de maneira rápida e eficiente. Seu comprimento variava entre 20 e 40 metros e a sua largura raramente excedia os 3 metros, podendo ter até 36 pares de remos de impulso. Um aspecto marcante das embarcações vikings, em especial dos drakkars, são suas carrancas. Em sua maioria talhadas em forma de cabeças de dragões (também há exemplares de serpentes e cavalos), elas eram usadas para amedrontar tanto os inimigos quanto os espíritos da região na qual os vikings pretendiam saquear. Encaixadas na proa dos barcos, elas poderiam ser retiradas quando os navegadores escandinavos voltassem às suas casas ou quando iam visitar terras amigas.

Fotografia do Dreknor Carentan, ou "Dracar de Carentan", reprodução de um dracar normando construído na França.

        É sempre importante salientar que o modo de construção destes barcos de cascos rasos, com quilhas que penetravam muito pouco na água, não era comum no período, sendo este um fator que garantia que muitos ataques fossem feitos de maneira surpresa através dos rios. Tal engenharia garantiu que os vikings cruzassem o mar e também navegassem pelos rios continentais, permitindo uma rota direta aos corações das cidades, trazendo saques rápidos e inesperados. Um traço característico na construção naval viking era o casco de forma simétrica, com os talhamares curvos da mesma altura na proa e na popa. Há quem considere o drakkar viking a maior conquista tecnológica e artística da Europa medieval.
        Apesar das duas maiores e mais importantes categorias existentes para diferenciar os navios vikings (langskip às necessidades de guerra e exploração; knorr às necessidades de comércio, pesca e colonização), haviam outros tipos de embarcações na Escandinávia da Era Viking. Algumas delas eram o Karve e o Snekke como pequenos barcos de passageiros; o Byrding como navio de transporte; o Faering como barco de pesca; o Skeid, Busse e o Sud (além do Drakkar que era o maior) como longos navios de guerra.

O termo "drakkar"; histórico e arqueologia das embarcações
        
Imagens de navios vikings aparecem
em jóias (acima) e em pedras
memoriais (abaixo).
Apesar de muito difundido como sendo um termo originário do período viking para designar esse tipo de embarcação, "drakkar" é um termo de origem recente. Segundo o etimologista francês Alain Rey, o termo teria surgido por volta dos anos 1800, a partir do correspondente sueco drakar (plural de drake, que significa dragão), este mesmo similar ao nórdico antigo dreki. Alguns etimologistas (ex.: William Sayers em Scandinavian Studies Vol. 68), sugerem que o termo nórdico para estas embarcações seria langskip, que significa "navio longo", em oposição ao knorrskip, que é um "navio curto e largo".
        Os navios vikings geralmente navegavam com o vento através de velas. Foram os primeiros navios da história a usarem o vento como principal fonte de movimento (vemos aqui mais uma notável característica do sucesso tecnológico da navegação viking), só utilizavam os remos quando não havia vento. Até meados do século VI, os povos escandinavos não haviam desenvolvido velas em suas embarcações. Em 560, o historiador bizantino Procópio de Cesareia relata que eram povos que navegavam apenas com uso de remos. Gravuras dos séculos VI e VII, encontradas na Gotlândia, revelam sua evolução de um pano praticamente decorativo a grandes velas posteriores, ao mesmo tempo era desenvolvida a quilha (peça fundamental da estrutura de uma embarcação, que se prende na sua parte inferior e na qual se prendem todas as peças transversais que compõem a estrutura do barco) que fazia do bote um navio, capaz de grandes deslocamentos.
        Segundo James Graham-Campbell, arqueólogo e emérito professor de arqueologia medieval, os barcos não representavam apenas um meio de transporte corrente para os vikings: "a sua importância também manifestava-se no papel que desempenharam nos rituais religiosos do período. A gente de alta posição social era frequentemente enterrada em seus barcos e foi com a escavação de grandes túmulos funerários da Escandinávia no século XIX que começou por revelar aos olhos modernos o esplendor e a perfeição do barco viking".
        Uma dessas grandes escavações aconteceu no fiorde Oslo, Noruega, por volta de 1880, onde foram encontradas três embarcações, colocadas em diques pelos seus construtores. Transportadas para o Museu dos Barcos Vikings de Oslo, exibem as relíquias conhecidas pelos nomes dos lugares em que foram achadas: o navio de Tune, o navio de Gokstad e o navio de Oseberg. Este último é o mais famoso, era essencialmente um "iate real" magnificamente decorado, encontrado em um túmulo funerário do século IX de uma mulher de alta posição social. Exames arqueológicos indicam que ele nunca foi destinado a atravessar o Atlântico, no entanto, colaborou com numerosos indícios tanto sobre a construção naval viking como sobre a vida diária dos povos escandinavos daquele período. Diversos artefatos do cotidiano foram encontrados nele como trenós, baús de madeira, ferramentas agrícolas, peças têxteis, entre outros itens. O Gokstad é o maior navio do museu, com 24 metros de comprimento e 5 de largura, projetado para transportar até 32 homens, possuindo mecanismos de controle de velocidade e estabilidade, ideal para navegação em águas turbulentas e ataques-surpresa. Além destes, há os barcos de Skuldelev, mencionados anteriormente, encontrados no fiorde de Roskilde, Dinamarca, atualmente localizados no Museu de Barcos Vikings de Roskilde.

Fotografia do navio de Oseberg. Encontra-se no Museu dos Barcos Vikings de Oslo, na Noruega.

        Deixamos abaixo alguns endereços onde se pode conseguir mais algumas ótimas informações a respeito das embarcações nórdica da Era Viking:



Referências bibliográficas


James Graham-Campbell. Os Vikings, Grandes civilizações do passado. Editora Folio, 2006.
Eldar Heide. The Early Viking Ship Types. Editora Sjøfartshistorisk årbok, 2012.
Consulta à database virtual da Sagas Islandesas da Icelandic Saga Database.
Artigo sobre embarcações vikings do Hurstwic.
Consulta aos artigos "Scandinavian Studies" de William Sayers.

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